quarta-feira, 1 de junho de 2011

Um presente


-       - Alô?
-      -  Oi, amor, tudo bom?
-       - Lindo, onde você tá?
-       - Tô chegando em casa.
-       - Tá.
-       - Tá tudo bem?
-       - Aham.
-       - Então tá, beijo.
-       - Beijo.

 Andando na rua, olho para a nossa casinha, a sala está acesa, nosso quarto está apagado e o quarto da pequena está aceso. Entro no prédio, dou boa noite ao porteiro e pego o elevador. Chego em nosso andar, ando pelo corredor branco e paro em frente a nossa porta. O palpitante acelera inesperadamente, respiro fundo, coloco a chave na porta, abro e entro com o pé direito.  Na sala, um abajur aceso e um incenso. Olho para a varanda e você está sentada no chão, pernas cruzadas, sem os óculos, alongando seu pescoço, cabelo preso, olhos fechados.
Silenciosamente, coloco a mochila no sofá, pego a presente, tiro os sapatos e sento-me na sua frente. Deixo o presente escondido atrás de mim e delicadamente faço um carinho em seu rosto. Você sorri e abre os olhos.

-       - Tudo bem?
-       - Tudo bem e com você?
-       - Tudo bem. Você está preparado?
-       - Hein? Essa fala é minha!
-       - Você está preparado?
-       - Tô, sempre.
-       - Se eu tivesse uma flor a mão, agora seria um excelente momento para te entregar.
-       - Não seja por isso. Viro-me, pego a rosa branca e te entrego.

 Seus olhinhos enchem de lágrimas e você me entrega a flor sorrindo um sorriso diferente.

-       - Pensei na gente colocar a pequena pra dormir juntos, depois a gente ia lá pro quarto ficar de chamego, se amar e, quem sabe, brincar com as probabilidades. O que você acha?
-       - Amor, não precisa, nós acertamos de novo. Você me olha nos olhos, cheios de verdade.
-        
Silêncio. O palpitante acelera como na porta da casa, deixo-o bater, deixo a adrenalina correr, respiro escutando cada pulsação, fico dominado por um sentimento bom.

-       - Você tem certeza, né?
-       - Tenho, acabei de fazer dois testes, tão ali no banheiro.
-       - Amor, você vai ser mamãe de novo, que maneiro. Vou ser papai. Será que é menino ou menina?  Quando será que a gente fez? Calma, aí, será que a gente tava viajando ainda?
-        
Você sorri, segura a minha mão e coloca no seu peito, seu coração está a mil, você solta uma gargalhada, sorri e uma lágrima escorre no canto do seu olho, seus olhinhos pequenos vão se enchendo de lágrimas que escorrem até tocar sua boca lentamente, você segura minha cabeça, e nos beijamos vagarosamente, um beijo gostoso, cheio de sentimento.

Ouço a pequena abrir a porta do seu quarto, e fechar em silêncio, seus pés arrasantando pelo chão do corredor, chega na sala…

-       - Pai, você chegou. Eu tava com saudade. Por quê você demorou tanto?

Aquela frase me pareceu tão normal, mas vindo de outra boca. Enquanto ela fala, dou-te um beijo leve nos lábios, um na ponta do seu nariz e outro na testa. Com os olhos cheios de lágrimas, digo para ela:

-      -  Cheguei, meu amor. Eu também estava morrendo de saudade de você. O que você estava fazendo no seu quarto tão quietinha?
-       - Desenhando. Pai, por quê você e a mamãe estão chorando?
-       - Porque o papai e a mamãe estão muito felizes.
-       - Por quê?
-       - Porque a mamae tá gravida. Você vai ganhar um irmãozinho ou uma irmãzinha! Não é demais?
-      -  Mamãe, tem um nenêm dentro da sua barriga?
-       - Tem, minha linda.
-       - E como ele vai sair?
-        
Você ri da pergunta e olha para mim.

-      -  Daqui há nove meses ele vai chegar, meu amor.
-       - Mas vai ser ele?
-       - Não sabemos ainda, pequena. Vai ser surpresa!
-        
Sem perceber, me pego fazendo carinho na sua barriga, enquanto você deixa a sua mão sobre a minha, seguindo meus movimentos. Pego a rosa no chão e convido a pequena para sentar próximo a nós. Ela vem olhando séria, olha para a sua barriga com cara de quem não está entendendo. Se agacha e deita no seu colo, você delicadamente brinca com os seus cachinhos. Vagarosamente, ela fecha os olhos e segura minha mão.

Nos olhamos, os rostos molhados de lágrimas, sorrisos, um silêncio gostoso, ouvimos apenas os poucos carros que passam na rua lá embaixo. Você pisca lentamente, respira calmamente. Meu coração parece estar pulsando num ritmo diferente, lentamente pulsa, uma energia circula por todo o meu corpo, é bom, estou leve, respiro profundamente, encho meu pulmão.

Olho para a pequena e a vejo respirar lentamente, respiração tranquila, suas bochechinhas redondinhas, os olhinhos fechados, embalada naquele silêncio. Harmonia é a palavra que me vem a cabeça. Harmonia de sentimentos, de vontades, de respeito, uma troca entre nós três, um sentimento delicioso chamado amor. Percebo que você ainda me olha e dirijo meus olhos para o seu e você me sussurra:

-       - Te amo, meu amor! Amo muito. Obrigado por, mais uma vez, me proporcionar esse momento maravilhoso.

Me ponho a chorar. Deixo o sentimento fluir e sussurro para você:

- Esse momento é fruto do nosso amor, é um presente que nós estamos dando um para o outro. Essa criança que está por vir é mais uma flor para nós cuidarmos.

Aproximo meu rosto do seu até nossos lábios se tocarem, você beija meus lábios lentamente. Ali ficamos por um tempo, imóveis, boca na boca, respiramos, sentimos.

Ela se mexe para se ajeitar e puxa minha mão mais próximo ao seu peito.

-       - Vou levar essa aqui pra cama, vai indo ali pro quarto pra gente fazer um chamego só nós dois.

Você concorda com a cabeça. A pego no colo e levo para seu quarto, você vem me seguindo até a porta. Na sua pequena mesa de desenho está uma caixa lápis, um punhado de folhas de papel e um desenho muito colorido. Deito-a na cama, acendo o abajur, você paga a luz e caminha para o outro lado da cama. Ficamos abaixados olhando-a “mimica” profundamente.

- Será que vai ser outra menina?
- Outra gata na minha vida?
- Né?
- Ou um bacuri dos olhos claros?
- Um gato, igual ao pai.

Dou um beijo nas bochechas da pequena e lhe digo baixinho:

-       - Durma bem, meu amor!

“Boa noite” você diz e a beija na testa. Nos levantamos, deixamos a porta encostada e vamos para nosso quarto, você entra, pega sua camisola e começa a se despir, tira sua roupa e joga no cabideiro. Veste a camisola, se deita na cama lentamente, ajeita o travesseiro e deita a cabeça levemente enquanto fecha os olhos.

-      -  Me abraça?
-       - Abraço.

Visto meu pijama e deito atrás de você, te abraço, você agarra meus braços e os aperta contra seu peito, uma conchinha perfeita, uma delicia.

Silêncio. Paz. Muito amor. Um presente.

Um comentário:

  1. Lindo,
    Eu leio um texto desses e fico sem palavras. O que você sonha pra gente é sempre tão lindo, tão puro, tão sincronizado com os meus sonhos, que eu fico até na dúvida se foi você que sonhou sozinho ou se vc leu a minha mente em algum dia desses.
    Te amo muuito, meu amor, muito.
    Beijos
    Namorada

    P.S. Sim, sim, vc me fez chorar....

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